De
Ribeirão Preto – SP, RUTH RENDEIRO, jornalista, sentindo
esse cheiro de PARÁ fervendo, nesta época do pré-Círio, resolveu escrever um pouco de sua
história, de nossa história e de tantos papa-chibés que estão espalhados
por esse mundão.
Vejam o que ela nos conta.
PARA OS QUE QUEREM DIVIDIR MEU PARÁ
(Agradecimento
ao Raimundo Mário Sobral, que no seu dicionário Papachibé me ajudou a
recordar muitas expressões e ao Mauro Magalhães que leu e incrementou
mais o texto).
Sou
da terra onde a Lobrás se chamava 4 e 4 e se ia lá pra comprar
fechoeclair e trocar aquele que escangalhou na velha calça que fica no
redengue. No rumo da Presidente Vargas uma parada para... a merenda no
Jangadeiro:garapa e pastel eram os meus preferidos, mesmo que eu me
sentisse depois empanturrada, com vontade de bardear dentro do ônibus
Aero Clube. Às vezes o piriri era inevitável. Mal dava tempo de chegar
em casa.
Ahh
a minha casa... Morei anos e anos na Baixa da Conselheiro e um dos meus
divertimentos preferidos era pegar água na cacimba da Gentil. Sempre
fui meio alesada e deixava boa parte da água pelo caminho. O balde
chegava quase sem nada, motivo pra ouvir da minha avó: não te brigo nem
te falo, só te olho.
Na
minha terra não se empina pipa, mas papagaio, curica e cangula, sempre
olhando pra ver se eles não estão no leso e nunca deixando a linha
emboletar. Depois do laço, a comemoração, maior ainda se cortou e
aparou. Se perdeu a frase inevitável: laufoiele. Era um segurando o
brinquedo artesanal feito de qualquer papel, enquanto o outro gritava de
longe: larga ! E o empinador sai correndo. Não gostava dessa função,
sempre me abostava e os meninos eram implacáveis: cheira lambão, a velha
caiu no chão e depois ainda me arremedavam...
Peteca
ou fura-fura eram mais compatíveis com a minha leseira. Um triângulo
desenhado no chão e dentro dele as pequenas bolinhas de vidro. Tirou de
lá, ganhou a que saiu ou quem conseguia o tel. No fura-fura era
essencial amolar bem a ponta do arame e sair jogando, emendando um ponto
a outro sem nunca deixar que o adversário nos cercasse.
Lá
na minha terra peixe não fede, tem pitiú e quem não toma banho direito
tem piché. Gostamos de ser chamados de papa-chibé, aquele que adora uma
farinha e que faz miséria com ela. Manga com farinha, doce de cupuaçu
com farinha, sopa com farinha, macarrão com farinha. Um caribé bem
quente, ralinho serve pra dar sustança ao doente e um chibé é excelente
com peixe fritinho. Farinha só é ruim quando dizem: ihhh ta mais
aparpada que farinha de feira !
O
pirão do açaí é quase um ritual... Pode-se usar farinha d’água baguda
ou mesmo a fina amarela, mas nada melhor que uma farinha de tapioca bem
torradinha. Depois de tomar uma cuia bem cheia (meio litro em diante),
daquele um, tipo papa é inevitável deixar a mesa todo breado e
empanturrado. A barriga por acolá de tão cheia. Hora de ir para rede
reparadora. Uma hora de momó é suficiente pra curar aquele
despombalecimento.
A
gastronomia na minha terra é tudo de bom. Se não tem pão comemos
tapioquinha com manteiga ou pupunha no café, quem sabe até um bolo de
milho recém-saído do forno com uma manteiga por cima da fatia,
derretendo. O pão pequeno é careca e o curau, canjica e a canjica,
mingau de milho. Tem gente que não gosta e ficava encarnando que esses
pratos não são típicos. Preferem uma unha com bem pimenta ou um beijo de
moça bem torradinho.
Na
minha infância o doce que mais consumíamos, em frente ao Grupo era o
quebra-queixo. De amendoim ou de gergelim. O risco era ele cair na
panela que sempre havia na boca da molecada. A dor era insuportável!
Muitas vezes voltei pra casa correndo, debaixo de chuva pra colocar
álcool no dente, adormecer até a panela parar de doer. – Vai na chuva
mesmo? – Claro não sou beiju !
Nossa
Senhora de Nazaré, pela intimidade que temos com Ela, pode ser chamada
carinhosamente de Naza e a erisipela de izipla. Cabelos grossos e
cortados curtos viram espeta caju e quem pede muito é pirangueiro, filho
de pipira. É proibido malinar, andar fedorento, ser um pirento
inconveniente, desses que arrancam o cascão.
Embora
politicamente incorreto, adoro lembrar o “carro da phebo” passando e os
lixeiros invocados tendo que ouvir esses gracejos.
Quantas
vezes ouvi da minha avó, da minha mãe: - So te digo vai ! ou de uma
amiga pedindo para que a gente se demorasse mais um pouco: - Espere o
vinho de cupu. E o calendário paraense que além do ontem tem o dontonte e
o tresontonte ?
Nos
orgulhamos de falar tu e conjugá-lo corretamente, mas quem nunca ouviu
essa frase? – Passasse por mim me olhasse, fizesse que nem me visse, nem
falasse.
Esse
é o meu Pará que querem dividir. Retalhar não só o território, mas as
falas, as tradições, a cultura, a sua História. Minha terra correndo o
risco de não ser esse colo materno único, ímpar, que acolhe, que abriga
da chuva, que nos enche de orgulho de ser não apenas Belém, mas Alter do
Chão, Bragança, Soure, Altamira, Conceição do Araguaia, Ourém,
Alenquer, Curucá ...
Talvez
os que acreditam que a divisão é o melhor tenham batido na mãe, comido
manga com febre e não entendido a metade do que está escrito aqui !
(RUTH RENDEIRO)
dizer nao a divisao do estado é facíl, dificil é voce morar no interior e se sentir esquecido pelos governantes, ha voces que dizem nao a divisao venhao viver a nossa realidade, e saber por que defendemos tanto essa divisaodizer nao a divisao do estado é facíl, dificil é voce morar no interior e se sentir esquecido pelos governantes, ha voces que dizem nao a divisao venhao viver a nossa realidade, e saber por que defendemos tanto essa divisao
ResponderExcluir