Pesquisa mostra retrato da violência

Pesquisa da Universidade Federal do Pará (UFPA) revela que o índice de crimes não registrados em Belém chegou a 68,39%, entre agosto de 2009 e julho de 2010. Isso significa dizer que, a cada 10 crimes, sete não foram registrados. De acordo com os entrevistados, a principal razão para não formalizar a ocorrência policial é achar que nada seria resolvido. Essa resposta atingiu o percentual de 67,20%.


Essas informações foram obtidas graças ao estudo A formação da desinformação: As subnotificações de violências em Belém, desenvolvido pela equipe do Grupo de Estudos e Pesquisas Estatísticas e Computacionais (Gepec) e pelo Laboratório de Sistemas de Georeferenciamento (Lasig).

A pesquisa utilizou um questionário elaborado pelo Lasig, com trinta perguntas que avaliaram diversos fatores relacionados à violência. As respostas, analisadas estatisticamente pelo Gepec, servirão de base para outras pesquisas em diferentes áreas. O objetivo era elaborar um quadro mais geral sobre a violência em Belém a partir das subnotificações de crimes na cidade, ou seja, a quantidade de ocorrências que não são registradas oficialmente.

Para Edson Ramos, professor de Estatística da UFPA e coordenador da pesquisa, conhecer as subnotificações é importante para a gestão pública, pois, atualmente, a administração de segurança é pensada de acordo com o número de crimes registrados.
"O Poder Público precisa saber que a realidade é duas ou três vezes maior do que os números oficiais. Isso vai dar subsídio suficiente para que os gestores de segurança pública tomem decisões que transformem Belém em uma cidade mais segura", avalia o professor.

A pesquisa entrevistou 1.268 pessoas, entre os dias 20 e 25 de agosto de 2010, em todos os 71 bairros de Belém. Esse já é o terceiro trabalho do Gepec sobre a violência na cidade, os outros estudos foram realizados nos anos de 2006 e 2007.

"Esta foi a pesquisa sobre violência, em Belém, com menor margem de erro até o momento. Geralmente, as pesquisas têm um erro amostral de 5%, nós consideramos uma margem de erro de 2,8%. Então, esse número é mais do que suficiente para subsidiar qualquer decisão relacionada à violência na cidade", destaca o coordenador.

6ª feira é apontada como o dia mais perigoso
Alguns resultados surpreendem e derrubam as ideias sobre criminalidade, os quais fazem parte do senso comum. A primeira surpresa é que 70,55% dos entrevistados afirmam que nunca foram vítimas de nenhum tipo de crime. Dos 29,45% que declararam terem sido vítimas, a maioria (91,85%) foi roubada. "O crime de roubo sempre apresenta o maior índice na Região Metropolitana de Belém", confirma o professor Edson Ramos.

Mais de 51% dos entrevistados foram testemunhas de algum delito. Aqueles que somente presenciaram os crimes chegam a 85,14% para roubo e 7,10% para homicídio. A sexta-feira é apontada como o dia mais violento e o período da noite como o mais perigoso. "Sexta-feira é o dia com maior número de crimes e também quando as pessoas os presenciam mais. Depois, com o final de semana (sábado e domingo), considerando um pouco da madrugada de segunda-feira", afirma o professor.

Em 2010, o mês de agosto foi o mais violento, com o percentual de 15,79% de delitos para vítimas e 33,39% entre os que presenciaram os crimes. Os entrevistados tendem a se lembrar dos eventos mais recentes, fazendo com que os meses mais próximos apresentem um índice mais elevado.

Em se tratando de locais onde ocorreram os crimes, a rua foi o mais citado, tanto por quem sofreu (73,66%), quanto por quem presenciou (76,85%). E o bairro Guamá foi o mais relatado na pesquisa, segundo vítimas (8,29%) e testemunhas (7,69%). A explicação pode estar na falta de infraestrutura do bairro localizado na periferia de Belém. O local possui grande população, problemas de saneamento e poucas áreas de lazer.

Porém, houve mudanças. O bairro Terra Firme, por exemplo, era considerado um dos mais violentos e hoje está em 4º lugar.
Segundo o professor, a criminalidade migrou da Terra Firme para os bairros vizinhos, como Marco e Guamá.

Outra descoberta importante foi que os criminosos, na maioria das vezes, agiram em dupla. Foi o que disseram 49,43% das vítimas e 45,46% dos que presenciaram os crimes. Segundo 45% das vítimas, a maioria dos criminosos estava a pé. A pesquisa aponta a bicicleta como o segundo meio de locomoção mais utilizado pelos bandidos.

Uma grande parcela das vítimas disse que os criminosos usavam arma de fogo (66,16%). Esse tipo de armamento também foi o mais usado segundo os que presenciaram o delito (69,63%) . Além disso, 19,73% das vítimas e 32,60% das testemunhas responderam que houve uso de violência no momento do crime.

Medo ainda impede registro

Uma constatação importante da pesquisa é o grande descrédito da população para com a polícia referente à solução de problemas. Esse descrédito se traduz em um percentual de 70% de pessoas que não pediram auxílio policial. Dos que pediram, 35,52% recorreram ao número 190 e 27,10%, à polícia militar. O percentual de pessoas que pediram auxílio policial se aproxima dos 31,61% que realizaram ocorrência policial.

Existem diferenças entre pedir auxílio policial e fazer a notificação. A polícia pode prestar socorro e não fazer o registro, dependendo da vontade da vítima, já que o registro ficará gravado para sempre. Um exemplo é a agressão à mulher após a Lei Maria da Penha. Muitas vezes, a vítima chama a polícia para socorrê-la, mas não assina o registro para que o marido não seja preso.

A maior parte das notificações é feita nos bairros que possuem delegacias. Assim, eles também concentram registros de localidades próximas, como Icoaraci, que acolhe denúncias do Tapanã, de Outeiro, da Pratinha e das ilhas.

De acordo com o professor Edson Ramos, o descrédito das pessoas está presente em suas falas. Respostas como "não vou porque a última vez que eu fui, até hoje, não tive resposta do crime denunciado" ou "eu não vou porque, no futuro, vai sobrar para mim" são frequentes. E o medo tem fundamento, visto que 17,03% dos entrevistados conhecem o criminoso e 63,93% afirmam que, muitas vezes, ele é morador das proximidades.

A sensação de insegurança está por toda a cidade. Desde os bairros menos estruturados até os mais urbanizados. O problema administrativo de maior relevância para a população é a falta de ronda policial. Nos bairros mais populares, as rondas não são realizadas por problemas estruturais, como falta de asfalto e espaço para a passagem da viatura. Nos bairros mais nobres, apesar do acesso facilitado, as viaturas não chegam aos locais mais perigosos.

O retrato da violência

• Roubo é o crime mais cometido;
• Sexta-feira é o dia mais violento;
• A noite é o período mais perigoso;
• Bandidos agem em duplas, a pé ou de bicicleta;
• Criminoso é conhecido ou morador das proximidades;
• Rondas policiais não aliviam a sensação de insegurança;

Pesquisa realizada no período de 20 a 25 de agosto de 2010, em 71 bairros da cidade.

http://www.ufpa.br/beiradorio/novo/index.php/leia-tambem/121-edicao-90--janeiro/1140-foto-acervo-do-pesquisador

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