Ari Queiroz*
Foi
preciso uma humilhação com grave exposição da vida de quatro soldados –
termo aqui utilizado em sentido amplo, sem preocupação com suas
graduações – a eminente risco de morte; foi preciso que esses mesmos
quatro soldados fossem assaltados e ficassem sem suas pistolas .40 e,
pior de tudo, fossem algemados uns aos outros com as próprias algemas e
deitados no chão, certamente pedindo clemência a bandidos destemidos – e
desmiolados – para que não os matassem; foi preciso o espancamento de
quatro soldados espancados por sete assaltantes enquanto atendiam a uma
ocorrência até rotineira… enfim, foi preciso o desnecessário para nossas
autoridades enxergarem o óbvio: bandido não tem medo das graves penas
previstas em lei alguma, nem de regimes prisionais endurecidos, cadeias
com muros altos e sem conforto, como telefone celular, visita íntima –
leia-se, motelzinho particular – e saídas temporárias para visitar a
mamães que não visitou enquanto estava solto!
O
provável não assusta bandido.
Só o real, e o real, no caso, é a polícia
nas ruas atuando de peito aberto para nos transmitir segurança. Bandido
tem que saber que as penas previstas em lei e o regime prisional
endurecido não passam de promessas vãs; tem que saber que, se não andar
na linha, se violar as pessoas ou seus bens – mesmo que essas pessoas
não sejam quatro policiais em trabalho -, enfim, se agir como bandido
não ficará impune. E isso, quem pode mostrar a eles é a Polícia Militar,
especialmente por meio de forças especializadas, como ROTAM, GIRO ou
CHOQUE, basta olharmos um pouco para trás, para a denominada “operação
de legalidade” que tanto critiquei pela forma como fundamentos, mas
nunca pelo óbvio, para se chegar a essa conclusão. Naqueles poucos meses
de início de 2009, quando milhares de policiais fardados foram para as
ruas fechar bares e botecos por estarem sem alvará de licença,
aproveitando para prender alguns bandidos que dessem bobeira, a nata da
bandidagem se recolheu e a criminalidade, logicamente, caiu às
escâncaras.
Na
época, externei, com todas as letras, no artigo “ilegalidades da
operação legalidade”, meu respeito para como nossos soldados e ressaltei
a importância da farda afirmando-a ser a “arma das mais importantes
para o policial, no mínimo, servindo para desestimular ou inibir a
atuação dos bandidos de menor calibre e impor mais cuidados no modo de
agir dos de grande”, acrescentando, ainda, que “enfrentar a bandidagem
com rigor é sua missão, a qual esperamos e necessitados seja bem
cumprida”. Por isso, aplaudi nossos soldados e, logicamente, a
Corporação como um todo. Mas sem fechar os olhos ou ouvidos para a
realidade – a população satisfeita com o fechamento de milhares de bares
e botecos e a sensível diminuição da criminalidade -, duvidei da
eficácia temporal da ação. Disse, naquele artigo: “Não me iludo,
contudo, com a temporariedade. A ação ostensiva da polícia põe os
bandidos em férias por uns dias, mas a onde passa. A criminalidade
diminuiu pela presença da polícia, não pelo fechamento de bares.”
O
tempo, infelizmente, tem me dado razão, de certa forma mostrando que o
aperto nossas ruas não comporta, ao mesmo tempo, policiais e bandidos.
Alguns meses antes de artigo acima citado, em outro mais expresso,
chamado “Sesquicentenário da Polícia Militar e Rotam 24 horas”, defendi a
necessidade dessa força policial sair dos quartéis e ir para as ruas.
Creio ser da lembrança de todos que, em 2008, cedendo à pressão,
especialmente de alguns setores da imprensa, que vinculavam a Rotam com
mortes de pessoas, o governo, sem nem mesmo se preocupar em analisar a
folha corrida dos mortos, acabou mandando nossos soldados da Rotam se
recolherem ao quartel durante o período noturno. A bandidagem, claro,
agradeceu; as ruas ficaram mais espaçosas; podiam agir com mais
versatilidade. Os dias se passaram e o óbvio, até por ser óbvio,
ocorreu: o número de crimes, em particular com resultados em morte,
cresceu absurdamente, obrigando o governo – essa instituição que, sem
saber o que fazer, faz o que não sabe fazer – a determinar a volta da
Rotam para as ruas 24 horas por dia. A criminalidade caiu.
Como
verdadeiro sistema binário, polícia e bandido não andam juntosQuando a
primeira trabalha, o segundo se retrai; ao contrário, polícia retraída,
assustada, humilhada e soldados, em geral, desestimulados é o sonho de
consumo da bandidagem, que aproveita o momento para agir como se
estivesse em confortável spa. A prova mais recente foi o assalto aos
quatro policiais, aos que me referi no deste artigo. Não sei qual terá
sido a leitura da população a respeito, sendo até possível que muitos,
inclusive inocentes, tenham ficado satisfeitos, mais por ignorância que
outro motivo, mas o fato é extremamente preocupante. Se policiais
treinados para combater o crime e ocupando duas viaturas são assaltados,
algemados, espancados e ficam sem suas armas, o que não espera a nós,
que não temos viaturas, nem armas, nem somos treinados para lutar com
bandidos?
Por
tudo isso, defendo, claramente, a presença ostensiva da polícia nas
ruas
Mais claramente ainda, defendo o uso de viaturas camufladas,
fardas pretas e soldados com caras fechadas parecendo de poucos amigos.
Logicamente, isso não pode significar, nem justificar, truculência,
arrogância, abuso de autoridade ou grosseria por parte de militares, nem
permitir atos de achincalhe ou humilhação contra pessoas. O mal polical
deve ser punido, assim como o bom bandido. Aliás, todo bandido é bom – o
sentido do “bom” aqui é pejorativo – e deve ser tratado com rigor,
punido de acordo com nossas leis até saber que nós, o povo, temos o
direito de não ser suas presas. Do outro lado, todo policial é bom – o
sentido do “bom” aqui é real – e deve ser tratado com respeito, até que,
eventualmente, se prove não merecer a farda.
Enfim,
nossas autoridades da segurança pública sabem, ou devem saber, e, por
isso, devem deixar claro para todos – inocentes, bandidos e policiais –
que nessa área quem manda é a polícia. Mais particularmente, o
secretário de segurança pública deve saber, proibindo os militares de
fiscalizarem a jogatina que se combate o jogo ilegal; muito mais, após o
assalto aos nossos quatro soldados, deve ter tomado consciência que o
fato de algumas viaturas terem circulado com sirenes e giroflex ligados
nas ruas de grande empresa jornalística não justifica proibir que toda a
força – leia-se, Rotam – seja aquartelada. Vamos ganhar esse jogo! Nós
mandamos nessa praça e isso deve ficar bem claro para os bandidos.
Nossos porta-vozes para dar o recado são os policiais de todas as
forças, mas, especialmente, os militares, Rotam neles!
*Ari Queiroz, doutor e mestre em Direito Constitucional, Juiz de Direito e professor universitário e de pós-graduação na PUC-GO.Colaboração TC PM/PA Puty
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